quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Assassino de ocasião

Foto: http://arymoura.wordpress.com

O que foi que eu fiz? - foi a primeira pergunta que Rafael se fez assim que encostou o carro no acostamento.

A grande quantidade de fumaça que saía por debaixo do capô do veículo, que ainda se encontrava ligado, era um lembrete de que havia acabado de fazer algo errado.

Um único segundo de desatenção foi o suficiente para que atropelasse algo que atravessara a estrada alguns segundos antes.

Fora tudo muito rápido. Tanto que não viu absolutamente nada, apenas sentiu um solavanco.

Temeroso pelo que encontraria ao sair do carro, Rafael respirou fundo. 

Após desligar o motor, abriu o porta-malas e pegou uma lanterna que mantinha junto ao pneu reserva, a qual só acendeu após uma dúzia de tapas.

Iluminou a frente do carro e percebeu que a lanterna do lado do caroneiro estava quebrada. A lataria, igualmente, estava bastante amassada. Concluiu que deveria ter batido em algo grande. Algo definitivamente sólido.

Receoso pelo que o aguardava, Rafael caminhou lentamente até a parte traseira do carro. Pelo força do impacto, pensou que poderia ter atropelado algum animal. Somente depois de caminhar uns vinte metros que conseguiu vislumbrar o maior dos seus problemas.

- Caralho! - disse para si mesmo em voz alta.

Envolta em uma poça de sangue, havia uma pessoa estirada no chão. Estava bem no canto da estrada e visivelmente machucada. Deu mais dois passos em direção ao corpo e constatou que se tratava de alguém do sexo masculino.

Sem saber o que fazer, Rafael levou as duas mãos à cabeça. Precisava tomar alguma atitude.

- Senhor! - gritou, quase gago. - O senhor está bem? Senhor?

Gritou mais algumas vezes, e à medida que suas perguntas não eram respondidas, uma sensação de pânico tomou conta de seu corpo. Não precisava ser médico para ver que o sujeito estava morto.

Precisava acalmar-se. Então, respirou fundo, olhou mais uma vez para o corpo e caminhou em sua direção. Lembrou-se dos filmes, em que as pessoas sempre colocam a mão no pescoço para medir a pulsação e fez o mesmo. Estava realmente morto, embora o corpo ainda estivesse quente.

- Meu Deus, o que foi que eu fiz? - tornou a se perguntar em voz alta.

Imediatamente, pensou em ligar para a polícia. Mas foi só olhar para o display do celular e ver os números turvos para lembrar-se de que havia bebido demais naquela noite.

Se fizesse bafômetro naquelas circunstâncias, sairia dali algemado. Sabia que, ao dirigir sob a influência de álcool, havia assumido o risco de cometer um crime, o suficiente para que seu medo tomasse proporções impensadas.

Aparvalhado com a possibilidade de ser preso, tomou enfim uma atitude. Com toda força que lhe restava, arrastou o homem pelos braços até seu carro. Aqueles poucos metros pareciam muitos; nada que a teoria da relatividade não explique.

Imaginou que se algum adolescente abusado resolvesse filmar tudo com a câmera do seu celular, seria o seu fim. Uma coisa é atropelar alguém e pedir socorro. Outra, bem diferente, é atropelar alguém e esconder este alguém dentro do porta-malas do carro.

Levantou o homem com certa dificuldade e escorou suas costas na entrada da mala do veículo. Com a ajuda da luz pôde ver melhor seu rosto. Aquele homem, cuja idade era visivelmente avançada, definitivamente tinha cara de "zé".

Rafael achou que ficaria mais assustado ao ver o rosto do homem que havia atropelado, haja vista que não possuía muita familiaridade com cadáveres. Porém, sentiu-se estranhamente calmo ao descobrir a face de sua vítima.

Sua barba era cinza e grande. Parecia mais um desses aspirante ao cargo de papai noel. Teve vontade de rir. Afinal, matar o papai noel seria algo relativamente muito engraçado.

Após analisar detidamente seu corpo, tratou de empurrar seus pés para dentro e fechar o porta-malas. Ato contínuo, pegou uma flanela e limpou o sangue que havia escorrido sobre o pára-choque traseiro.

Após, entrou no carro, ligou o motor e arrancou bruscamente

Havia começado sua corrida contra o tempo.

sábado, 17 de novembro de 2012

Te quero...

http://leandrons.blogspot.com.br

Carlos Alberto tinha uma teoria um tanto ousada quando o assunto era conquistar mulheres.

Vivia dizendo para os amigos que havia descoberto o plano perfeito, embora nunca tivesse colocado-o em prática.

Sua teoria consistia, basicamente, em chegar no ouvido da mulher que pretendia conquistar e dizer aquelas que considerava as suas palavras mágicas.

Argumentava que as palavras em questão teriam um efeito impactante sobre toda e qualquer mulher, uma vez que criariam uma reação química capaz de deixá-lo irresistível.

Os amigos, claro, achavam tudo uma grande bobagem, sobretudo pelo fato de que as palavras mágicas eram "te quero".

Diziam para Carlos Alberto, aos risos, que ele levaria um tapa na cara na primeira vez que falasse isso para uma mulher.

Até que um dia, no auge da bebedeira, os amigos desafiaram Carlos Alberto a colocar em prática seu plano heterodoxo. Queriam provar para o amigo que o aludido plano só funcionava no plano teórico.

- Escolham qualquer mulher - disse Carlos Alberto. - Q-U-A-L-Q-U- E-R mulher!

Os amigos, prontamente, escolherem Mariana como alvo, uma colega de trabalho de Carlos inacreditavelmente linda e igualmente inalcançável.

Para surpresa de todos, Carlos Alberto topou o desafio, dizendo que no dia seguinte conquistaria sua colega somente com o auxílio de suas palavras mágicas.

No outro dia, já na parte da tarde, Carlos Alberto viu Mariana indo em direção ao elevador e julgou que aquela seria a oportunidade perfeita para colocar seu plano em ação.

Quando estavam apenas os dois dentro do elevador, preparou-se para o ataque.

Enfim, num movimento sorrateiro, recostou sua boca no ouvido esquerdo de Mariana e, com a voz mais aveludada possível, disse:

- Te quero...

Foi um "te quero" arrastado e libidinoso, o suficiente para que os pelos da nuca de Mariana ficassem arrepiados. 

Ela, porém, virou-se para trás assustada. Em seguida, gritou:

- Você está louco? Qual é o seu problema?

Carlos, ainda seguindo seu plano, apenas sorriu. Ato contínuo, lançou-lhe um olhar enigmático.

Sua bela colega de trabalho, contudo, como quem não entende nada, olhou incrédula para Carlos Alberto. E após ameaçar denunciá-lo ao chefe, saiu correndo do elevador.

À noite, quando contou aos amigos, todos, invariavelmente, caíram na gargalhada. Debocharam de Carlos Alberto e de seu plano nada infalível o máximo possível nas semanas que se sucederam ao ocorrido.

Cerca de oito semanas depois, no entanto, Carlos foi surpreendido com uma mensagem de Mariana, cujo conteúdo dizia: "Preciso falar contigo. Me encontre na cafeteria da esquina, agora".

Obediente, mas um tanto temeroso, dirigiu-se até o local programado. Lá chegando, deparou-se com sua colega aos prantos.

Mariana, sem meias palavras, disse a Carlos Alberto que, desde o evento do elevador, não conseguia pensar em outra coisa senão nele.

Disse-lhe, ainda, numa franqueza sem precedentes, que suas palavras haviam lhe despertado um sentimento transcendental. E que tudo que almejava naquele momento era deixar-se possuir por ele.

Carlos Alberto sorriu. Seu plano havia funcionado.

Dali, foram direto para o motel mais próximo e tiveram a tarde mais incrível de todas.

Carlos, claro, reuniu os amigos algumas horas depois para contar a novidade. Mas foi só terminar de relatar o que havia lhe acontecido algumas horas atrás para que todos caíssem na gargalhada. 

Ninguém acreditou que o plano do amigo havia funcionado de verdade. Ninguém.

- Conta outra, Carlos Alberto - diziam os amigos. - Conta outra...