terça-feira, 19 de março de 2013

O sopro da vida


Foto: http://4.bp.blogspot.com


É sempre a mesma história...
 
Basta Deus vir buscar alguém que conhecemos pela mão para lembrarmos da nossa iminente finitude.
 
Lembrarmos de que a vida não passa de uma passagem.
 
Quem nunca se colocou no lugar de alguém que deixou este plano prematuramente e se perguntou em silêncio "e se tivesse sido eu?"
 
É um tanto parodoxal o fato de que nós, seres surpreendentemente tão fortes, sejamos também tão fracos.
 
E essa fragilidade parece assustar a todos indiscriminadamente. Até porque, uma hora ou outra, será a sua vez de se sujeitar aos caprichos da morte, seja direta ou indiretamente.
 
Um colega de faculdade que perde um parente, uma amiga que perde o esposo, alguém que perde o pai... Até que, quando menos espera, "BUMMM", acontece com alguém próximo a você.
 
De repente, não é mais a vida desse alguém que vira de pernas para o ar, mas a sua própria. E será você quem estará no olho do furacão.

A morte me parece um aparelho de som no modo randômico, cuja escolha das vítimas, além de aleatória, sabe ser impiedosa.

E o pior é que, à medida que o tempo passa, a probabilidade de que algo aconteça com alguém próximo ou, quiçá, com você mesmo, só aumenta.

A vida, como costumam dizer, não passa de um sopro.
 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Notícias sobre o blog - 2013

Boas notícias!
 
Muito embora 2012 tenha sido um ano pouco produtivo para o blog, o que atribuo à correria no trabalho, os ventos parecem estar mudando.
 
A verdade é que 2013 está sendo muito generoso com o SegundaDose.com!!
 
Bastou voltar a atualizar o blog com frequência para as visitas multiplicarem-se.
 
Surpreendentemente, todos os textos postados este ano, sem exceção, vêm apresentando uma receptividade impressionante por parte dos leitores.
 
Tanto que no mês de fevereiro os números se aproximaram aos do recorde de acessos do blog, que remonta ao ano de 2011.

E pelo andar da carruagem, março será ainda melhor.

O mais interessante é que os acessos são oriundos de vários lugares do Brasil e do Mundo! Os chineses não me deixam mentir... (risos). 
 
Então, o que resta é escrever!

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Desde já, coloco-me à disposição para críticas, sugestões para contos, crônicas, e outros.

Contato através do e-mail: segundadose@gmail.com

 Abraço a todos!
 

sábado, 9 de março de 2013

O professor apaixonado...


Foto: pedagogiauvaibrapes.blogspot.com.br

Rafael sabia que estava ferrado como jamais estivera. 

Com 42 anos recém completados, lecionava história na Universidade Federal do Estado. E por mais que a educação neste país seja um instituto desvalorizado, esse estava longe de ser o seu maior problema.

Sua aflição tinha um nome composto: Ana Maria. Conhecida nas redondezas como a bela, arrebatadora e inalcançável Ana.

Ana Maria seria apenas mais uma de suas devotas alunas da faculdade não fosse uma única peculiaridade: Rafael estava perdida e dolorosamente apaixonado por ela.

Sentia-se o próprio Sr. Holland do filme Adorável Professor, de modo que se encontrava momentaneamente sôfrego.

Nunca, nos seus anos de magistério, havia se deixado levar por uma paixonite ou coisa parecida. E, acima de tudo, sempre respeitou muito suas alunas, cuja faixa etária variava de 20 a 23 anos.

Desta vez, no entanto, havia sido fisgado como um peixe faminto. E a bela Ana Maria era o anzol. 

Ocorre que Ana era uma dessas mulheres inatingíveis, cuja beleza chega a ser intimidadora. Exclusivamente por conta disso, imaginava que não tinha a menor chance com ela.

Sofreu em segredo durante boa parte do semestre, até que em mais uma de suas famosas aulas sobre o contestado, numa brincadeira habitual, involuntariamente, acabou deixando transparecer seus sentimentos aos demais alunos da classe. 

Daquele dia em diante, era só o professor entrar na sala para que os alunos começassem a cochichar

Embora receoso com uma possível represália por parte da coordenação do curso de história, Rafael sabia que estava chegando o dia de externalizar seus sentimentos por Ana Maria. 

Afinal, não queria ser mais um desses homens que enlouquecem por conta de uma paixão mal resolvida.

A verdade é que preferia ser rejeitado a ser covarde.

Então, na penúltima aula do semestre, pediu a Ana Maria - diante da presença de todos os outros alunos - que lhe esperasse após o sinal. Queria lhe falar em particular.

Seu pedido antecedeu um mar de risadas e conversas paralelas, uma vez que todos imaginavam qual era a real intenção do professor. 

Surpreendentemente, assim que todos deixaram a classe, Ana lançou um olhar que demonstrava reciprocidade ao interesse do professor, o suficiente para que se sentisse intimidado.

Rafael, mesmo sendo um cara otimista, não esperava que uma mulher como Ana pudesse se interessar por um professor de história de 42 anos.

Mas foi exatamente o que aconteceu. Exatamente!

Tanto que não acreditou quando Ana, com um olhar de pantera, disse-lhe:

- Eu sei que você me quer, professor... Eu sei...

- Como é que é? - retrucou Rafael, incrédulo.

- Não se faça de bobo... - respondeu ela. - Que tal irmos para um lugar mais reservado? - completou.

Rafael engoliu em seco. Estava deveras aturdido com a proposta feita pela aluna.

Então, para sua própria surpresa e desagrado, desconversou e disse-lhe que não fazia ideia do que ela estava falando.

Esquivou-se com o argumento de que apenas queria lhe parabenizar pelo último trabalho realizado.

Em seguida, pegou sua pasta e foi embora da Universidade o mais rápido possível.

À noite, já deitado em sua cama, na tentativa de tentar se convencer de que havia agido certo, em meio a uma espécie de tremedeira transcendental, não parava de repetir baixinho para si mesmo:

- Aquela mulher era demais pra mim... D - E - M - A - I - S...

sábado, 2 de março de 2013

As amígdalas de Augusto

Foto: http://ciceroart.blogspot.com.br

Augusto sempre teve um gosto diferente quando o assunto era mulheres. Um gosto, digamos, nada convencional.

Por conta disso, sofria nas mãos dos amigos, os quais insistiam em tirar sarro de suas predileções sem qualquer piedade.

Como muitos por aí, gostava de mulheres gordinhas rondando a casa dos 40 anos. Algo comum, não fosse pelo fato de que Augusto tinha apenas 25 anos.

Certa feita, enquanto se gabava de ter passado a noite com uma gordinha de idade relativamente avançada, os amigos quase o mataram com suas brincadeiras.

Esse era praticamente o resumo de sua vida.

Até que uma cirurgia para retirada de amígdalas - que era para ser de rotina - fez com que sua vida tomasse outro rumo. 

Curiosamente, assim que Augusto recobrou-se da intervenção cirúrgica, sentiu-se um tanto diferente. Não sabia precisar o quê, mas algo havia mudado. Podia sentir.

Então, enquanto refletia a respeito, surpreendeu-se olhando para o derrière de uma enfermeira jovem e magra que passou pelo corredor.

Estranhou sua atitude, afinal, gostava de mulher roliças. Acabou atribuindo seu comportamento heterodoxo à quantidade de remédios para dor que havia ingerido.

Dias mais tarde, porém, quando já estava totalmente recuperado da cirurgia, Augusto notou que seu gosto por mulheres continuava diferente. Bastava passar por uma jovem e magra para ficar todo arrepiado.

- Mas o que diabos está acontecendo comigo? - perguntava-se o tempo todo, em pensamento.

Assim que contou a notícia aos amigos, estes puseram-se a rir freneticamente. Não aceitavam o fato de que o gosto de Augusto havia sofrido mudança tão brusca.

E, por incrível que pareça, os amigos, agora, riam do seu gosto por esbeltas.

Nos meses que se sucederam à intervenção cirúrgica, Augusto até tentou se aventurar com algumas gordinhas de outrora, mas nenhuma delas despertou seu desejo. 

Tudo o que passava pela sua cabeça eram mulheres jovens e magras. Nem mais, nem menos.

Sua mudança de gosto gerou uma tristeza tão grande que praticamente virou um candidato em potencial à depressão. 

O que mais o incomodava nessa história toda era o fato de não sentir mais atração por gordinhas. Não admitia passar por uma delas sem sentir o frisson habitual.


Até que numa quarta-feira de outono, avistou Laura - uma roliça colega de trabalho que habitava seus pensamentos desde sempre - jantando em seu restaurante favorito.

Sabia que se havia uma mulher nesse mundo capaz de libertá-lo daquilo que passou a chamar de "a maldição das amígdalas", essa mulher era a farta e opulenta Laura.

Na dúvida, decidiu arriscar a sorte. Até porque se obtivesse sucesso em sua investida, sua vida voltaria ao normal. Ao jeito que sempre gostou. 

Então, a passos firmes e confiantes, atravessou o salão e parou em frente à mesa de Laura. Em seguida, olhou-a dos pés à cabeça.

Para sua tristeza, a única coisa que sentiu foi uma vontade enorme de mandá-la parar de comer como um avestruz.

Desanimado, foi embora sem dizer uma única palavra. 

Sabia que, doravante, estava fadado a se interessar por mulheres belas e jovens. 

- Que saudade das minhas amígdalas - disse para si mesmo com a voz embargada. - Que saudade...